«A minha tia suicidou-se há alguns meses - continuou a voz feminina. - Ela passou quase oito anos sem vontade de sair do quarto, comia, engordava, fumava, tomava calmantes e dormia a maior parte do tempo. Tinha duas filhas e um marido que a amava. (...)
Só a vi reagir uma única vez: quando o marido arranjou uma amante. Então ela fez escândalos, perdeu alguns quilos, partiu copos e, por semanas inteiras, não deixava a vizinhança dormir com os seus gritos. Por mais absurdo que pareça, acho que foi a sua época mais feliz: lutava por alguma coisa, sentia-se viva e capaz de reagir ao desafio que se colocava diante dela(...)
O marido acabou por deixar a amante - continuou a mulher. - A minha tia, pouco a pouco, voltou à sua passividade habitual. Um dia, telefonou-me a dizer que estava disposta a mudar de vida: parara de fumar. Na mesma semana, depois de aumentar o número de calmantes por causa da ausência do cigarro, avisou todos de que estava disposta a matar-se.
Ninguém acreditou. Certa manhã, ela deixou-me um recado no atendedor de chamadas, a despedir-se, e matou-se com gás. Eu ouvi essa mensagem várias vezes: nunca ouvira a sua voz tão tranquila, conformada com o próprio destino. Dizia que não era nem feliz nem infeliz, e por isso não aguentava mais.»
(Veronika decide morrer, Paulo Coelho)
Só a vi reagir uma única vez: quando o marido arranjou uma amante. Então ela fez escândalos, perdeu alguns quilos, partiu copos e, por semanas inteiras, não deixava a vizinhança dormir com os seus gritos. Por mais absurdo que pareça, acho que foi a sua época mais feliz: lutava por alguma coisa, sentia-se viva e capaz de reagir ao desafio que se colocava diante dela(...)
O marido acabou por deixar a amante - continuou a mulher. - A minha tia, pouco a pouco, voltou à sua passividade habitual. Um dia, telefonou-me a dizer que estava disposta a mudar de vida: parara de fumar. Na mesma semana, depois de aumentar o número de calmantes por causa da ausência do cigarro, avisou todos de que estava disposta a matar-se.
Ninguém acreditou. Certa manhã, ela deixou-me um recado no atendedor de chamadas, a despedir-se, e matou-se com gás. Eu ouvi essa mensagem várias vezes: nunca ouvira a sua voz tão tranquila, conformada com o próprio destino. Dizia que não era nem feliz nem infeliz, e por isso não aguentava mais.»
(Veronika decide morrer, Paulo Coelho)